sábado, 31 de agosto de 2013

Diário Literário agosto/2013 o mês eterno que nunca acaba








A MSF (Médicos Sem Fronteiras) é uma organização internacional fundada em 1971, na França, por um grupo de jovens médicos e jornalistas. Motivada pela crença de que todas as pessoas, independente de etnia, religião e nacionalidade, têm o direito de receber assistência básica em momento de crise, a MSF trabalha em mais de 60 países com 03 mil funcionários internacionais. A ajuda financeira que financia os projetos da organização, 91% são de doadores privados e empresas, garantindo o máximo de independência de qualquer poder político ou econômico. Nove escritores vivenciam situações limites e relatam o comovente trabalho da organização.

O primeiro capítulo (Mario Vargas Llosa) é sobre a República Democrática do Congo, onde o problema número um são os estupros, que matam mais mulheres que a cólera, a febre amarela e a malária. Bandos, facções, grupos rebeldes, encontram mulheres do bando inimigo e a estupram, não tendo nada com prazer, e sim com o ódio. Relatos que perturbaram sobre a consciência de ser mulher. A MSF atua no local desde 1981. 

O texto de Eliane Brum contem relatos de famílias da região de Narciso Campero, na Bolívia, que foram vítimas da Vinchuca, também chamado barbeiro, chupão, bicho da parede, cascudo ou fincão. Na população rural, 70% da população tem Chagas, sobrenome do médico brasileiro que descobriu o protozoário que invade o inseto, que suga o sangue da vítima e defeca, e a mesma ao se coçar é infectada. Corporações farmacêuticas não tem interesse em investir na pesquisa de vacina e tratamento, pois se sabe que é uma patologia que mata em sua maioria os pobres. No caso da Bolívia, a população pobre e indígena, discriminada pela elite do país. 

Um dia desses citei com colegas o fato que sempre nas fichas médicas me perguntam se há casos de Chagas na família, ficamos em dúvidas quanto a isso. Pois sim, o parasita é transmitido na gravidez e os efeitos colaterais da medicação não permitem o tratamento durante a gestação. Os médicos sem Fronteira atuam na Bolívia desde 1986 e no capítulo há o relato de diagnósticos, monitoramentos, marca-passos (há muito preconceito quanto ao uso pelos próprios camponeses) e óbitos. Um pouco poético o capítulo, o que diminui a gravidade da situação, mas o relato final do médico, fecha com chave de ouro. 

Paolo Giordano narra no seu capítulo sobre Marije, uma jovem norueguesa, que vai para Bangladesh participar da equipe MSF e cuidar principalmente das crianças. Porém, não consegue segurar muito a onda... com razão. Transferida para a zona rural de Fulbaria, vai lidar com pacientes contaminados pelo calazar, ou leishmaniose visceral, uma patologia parasitária fatal transmitida pela picada de um mosquito. A jovem tem que lidar com a paixão em cuidar do próximo e sua vida pessoal, um tipo dilema e tanto. A MSF está em Bangladesh desde 1985.

No capítulo sobre Khayelitsha, Cidade do Cabo (Catherine Dunne) há relatos do estado título do capítulo, mas também há relatos de outros países africanos. A cidade tem uma das taxas mais elevadas de HIV e tuberculose na África e do mundo. A epidemia tem raiz no apartheid, nas migrações em massa em busca de trabalho Capítulo enorme e de uma realidade gritante. Muito dolorido os relatos registrados. Na África do Sul o número aproximado de soropositivos seria de cerca de 5,7 milhões, 17% da população mundial. Os Médicos Sem Fronteira atuam lá desde 1999 com um programa integrado para o tratamento da coinfecção do HIV e da tuberculose. A migração em massa desde a apartheid, a busca de emprego, a herança histórica maldita deixada por colonizadores, pobreza e o estupro coletivo, que vários jovens participam para poder iniciar a vida em gangues criminosas são algum dos fatores para a epidemia. A crença que uma menina virgem cura um adulto soropositivo é uma das aberrações que também contribui para o crescimento da contaminação. 

A Organização Médicos Sem Fronteiras atua na Grécia desde 2008 e tem oferecido apoio psicológico para os migrantes e requerentes de asilo nos centros de detenção de Fylakio, Venna e Pagani, na ilha de Lesbos. Alicia Giménez Bartlett, escritora de ficção foi convidada para relatar a ação médica e psicológica das pessoas presas nas fronteiras em busca de trabalho, pois a Grécia é a porta para a Europa. Interessante que a autora ficou chocada com os centros de detenções que visitou e sua filha lhe informa que em Barcelona (sua residência) também existem.

O capítulo de James A. Levine também relata sobre a República Democrática do Congo, mas ele narra a história de Paulit. Particularmente o texto de Esmahan Aykol, se utilizando de uma bolsa como narrativa, deixou muito a desejar. Acabou não dando a ênfase necessária para a situação de Maláui, atendida pela MSF desde 1996. O local tem escassez de pessoal médico, são dois para cada 100 mil habitantes.  

Na Índia a MSF atua desde 1999, com cuidados médicos e terapias contra tuberculose, malária, HIV/aids e calazar. Também dá assistência básica e especializada à população das regiões devastadas pela violência e por conflitos armados. Texto de Tishani Doshi. Em Burundi (Wilfried N´Sondé) a organização atua desde 1992 com acesso limitado e falta de pessoal. Esse cenário é particularmente nocivo às mulheres, pois um grande número morre no parto e milhares desenvolvem fístulas obstétricas. Para esse último caso, foi criado em 2010 o centro de Urumuri, para tratar mulheres que sofrem com essa fístula. No país a malária e a principal causa de doença e morte.

Indico! Trabalho digno de ser conhecido e compartilhado.