terça-feira, 19 de julho de 2016

Um copo de cólera - Raduan Nassar


Fui na pilha do livro que resenhei na última postagem (Lavoura Arcaica), do mesmo autor, e devorei esse livro de poucas páginas chamado Um Copo de Cólera.  Escrito em 1970, foi publicado somente em 1978, momento político no Brasil de ausência de liberdade de expressão política devido à Ditadura Militar. Nessa obra, o estilo não é o lírico e novelesco. Me atrevo a chamá-la de um tratado sobre o Id do início ao fim, sexo e cólera, em todos os sentidos. O autor, Raduan Nassar,nasceu em Pindorama e cresceu em São Paulo, onde cursou Direito e Filosofia pela USP. Depois do seu terceiro livro, Menina a Caminho, deixou de escrever. Bom, o livro é dividido em pequenas partes: A chegada, na cama, o levantar, o banho, o café-da-manhã, o esporro e a chegada (mesmo título inicial). Na chegada, a amante chega e o clima entre os dois (ele o espera em uma chácara distante nos arredores de São Paulo - conforme filme que vou citar mais à frente) dá a entender que são apenas isso, amantes. Logo mais, podemos desfazer esse pensamento. Não há diálogo, e pelo monologo do amante, ele acredita que quanto mais a despreza, mais ela depende emocionalmente dele. Na cama, enquanto ele a espera, reflete quanto é apreciado por ela, levando em conta sua tara por seus pés (comparados a lírios), No levantar, ela se agarra a ele e no banho, há mais pitadas de sensualidade entre os dois. No café-da-manhã, ele volta ao seu silêncio espartano, chamando pela terceira personagem, Mariana, a típica empregada protestante. No esporro, aí que o tumulto parece... ele em silêncio, ela após indagar sobre tal, toma o seu café e de repente, ele se levanta, deixando todos atônitos. Motivo: saúvas que romperam sua cerca! Ao retornar da sua luta quase que corporal para combater tais insetos, a amante diz: "é pra tanto, mocinho?". Para ele, não passa de uma inveja, pois ele não usou do mesmo ardor na cama e "ela não teve o bastante, só o suficiente". Se antes do sexo pareciam estranhos, que compartilhavam intimidades apenas carnais, agora no momento de cólera, pois chega a esse ponto, ambos vão mostrar suas verdadeiras opiniões em relação ao outro. Opiniões que vão desde "sua jornalista de merda" - lembrando que ele a despreza por ser fêmea emancipada e acredita que tudo que ela sabe, deve a ele -  a "seu fascista!". Nesses diálogos carregados de cólera, que percebemos o poder na linguagem para a defesa quando somos provocados. E sim, vejo diálogos com fundo politizado, uma linguagem engajada perfeita, que cita temas proibidos na época. Para tal, o autor escolheu nada mais que, um ex-ativista e uma jornalista politizada. No filme que deduzimos que ele é um ex-ativista. Falemos sobre o filme, então. Lançado em 1999, estilo drama, direção de Aluizio Abranches traz como protagonistas, Júlia Lemmertz e Alexandre Borges (na época, já casados). Também, Ruth de Souza (Mariana), Linneu Dias (Antônio) e participação especial de Marieta Severa (mãe). Informo que, são 20 minutos de cenas de sexo já no início do filme e que as cenas são fidedignas. Li em uma matéria que aconteceu de fato, já que ambos eram casados, não sei se é verdade. No filme, fica muito nítido a questão masculina de tentar dominar pela dependência e sobre o medo de perder a cerca. Não deixou a desejar, os dois arrebentaram. E se ela parte, após a violência física, retorna em A chegada, sendo a narradora, estando ele à sua espera. Dependente... 


"Ninguém dirige aquele que Deus extravia!"

"Hosana! eis chegado o macho! Narciso! sempre remoto e frágil, rebento do anarquismo"