Foi indicação de uma amiga que levo muito a sério sua opinião literária. confesso que no início não achei muito interessante e, inclusive, sem propósito. Talvez essa busca por uma linearidade logo de início fosse a causa. Deixei de lado por uma tempo.
Lóri, uma professora primária, mantinha um relacionamento descompromissado com um professor de Filosofia, Ulisses. Esse relacionamento parece uma luta entre sentir pelo impulso do corpo ou sentir com todos os resultados que ele pode causar. Quem sabe afinal o que vem após a entrega? Ulisses deseja ensinar algo a Lóri. Nada que seja filosófico, pois se assim fosse, bastava que ela assistisse suas aulas. Já Lóri, desejava ter tudo, mas sem a ansiedade de dever dar algo em troca. Ela vive em angústia de viver "apesar de". Para Ulisses, o "apesar de" que nos empurra para frente.
Ainda que tivesse aprendido a ter coragem de ter fé com ele, Lóri tinha medo da fé empurrá-la para um abismo, e depender da mão de Ulisses para salvá-la (e se a outra mão a empurrasse para o abismo ao mesmo tempo?). Ser humano para ela era conviver com a dependência e com a entrega, isso gerava o sofrimento. Aliás, sofrer era um sentimento que preenchia o seu ser e até preferia. Sem a dor, o que ficaria? Ela a protegia de uma possível intimidade de alma.
Nesse impasse que Lóri e Ulisses se despem do medo e da altivez intelectual e trilham o caminho dificultoso de serem o que são. Impossível não odiar Ulisses em alguns momentos e se contorcer diante da dependência consciente que Lóri sente, mas resistir tem lá o seu preço e há lá as suas máscaras sustentadas que são fugas desse tal de amor. o que mais levo dessa leitura é a oração de Lóri, é de uma delicadeza ímpar:
“… alivia a minha alma, faze com que eu sinta que Tua mão está dada à minha, faze com que eu sinta que a morte não existe porque na verdade já estamos na eternidade, faze com que eu sinta que amar é não morrer, que a entrega de si mesmo não significa a morte, faze com que eu sinta uma alegria modesta e diária, faze com que eu não Te indague demais, porque a resposta seria tão misteriosa quanto a pergunta, faze com que me lembre de que também não há explicação porque um filho quer o beijo de sua mãe e no entanto ele quer e no entanto o beijo é perfeito, faze com que eu receba o mundo sem receio, pois para esse mundo incompreensível eu fui criada e eu mesma também incompreensível, então é que há uma conexão entre esse mistério do mundo e o nosso, mas essa conexão não é clara para nós enquanto quisermos entendê-la, abençoa-me para que eu viva com alegria o pão que eu como, o sono que durmo, faze com que eu tenha caridade por mim mesma pois senão não poderei sentir que Deus me amou, faze com que eu perca o pudor de desejar que na hora de minha morte haja uma mão humana amada para apertar a minha, amém."
Amém!