segunda-feira, 21 de abril de 2025

Muito Louca - Netflix

 


    Bom, eu busquei filmes de 90 minutos (tenho TDAH e filmes longos são torturantes pra mim) e na verdade a duração de Muito Louca é de 1h34. Tudo bem! Eu e meu esposo ficamos vidrados em Natalia Oreiro, atriz e cantora uruguaia, que fez o papel de Pilar. People, é comédia. Ponto! Mas eu penso como Freud "Brincando a gente pode falar tudo,inclusive a verdade".


    Pilar é uma profissional que está na transição do pai para o filho em uma empresa de publicidade e agora é chefiada por um jovem que anseia por inserir as novidades virtuais em campanhas tradicionais. Percebemos a presença de uma influencer (que descobrimos que só participa da tal campanha publicitária por causa de Pilar, uma mulher quase quarentona). Toda essa tecnologia deixa Pilar deslocada e insegura. Quem nunca? (Nós geração 50/60/70). 

    Enquanto isso, vive amizades que não desconectam do aparelho telefônico, de um enteado que não a respeita e de um marido que não a auxilia nas tarefas domésticas. Quem nunca? Porém, um amigo de anos vai se casar com uma moça da geração atual, e juro, sem dá spoiler, achei Pilar, deveras corajosa. Mas o que quero apontar mesmo é a figura do psiquiatra/psicólogo. Por mais que seja uma produção argentina, percebemos uma mulher medicamentada que aceita tudo e em nada é auxiliada pelo profissional. Quem nunca em várias nacionalidades?

    Um rito, que no decorrer do filme, coloca Pilar no centro da ação, demonstra que o poder de limite e ação sempre esteve nela e com ela. O filme é interessante por abordar conflito de gerações, tecnologia, decisões, saúde mental e limites. Não é o final que eu esperava (geração passada), mas muito válido. 

Era uma vez um sonho - filme Netflix

    Juro por todas as musas gregas que eu não conhecia esse filme de 2020 e que acabei escolhendo por acaso. Assino a plataforma de streaming Netflix por ter em seu catálogo a maioria das animações japonesas do Estúdio Ghibli. Por que não usufruir? Meu esposo ama filmes (eu, não muito) e nesse dia decidimos algo bem café com leite. Bom, não foi. Um tema bem punk! 

    Gente, eu amo Glenn Close desde Atração Fatal (1987) e saiba, ela simplesmente é o foco do filme Era uma vez um sonho. Eu sempre gosto de pesquisar críticas do que assisto: antes, durante e depois. Meu esposo vive me criticando por isso. Enfim, essa sou eu. Em uma dessas pesquisas descobri que o filme é baseado na biografia/livro (1ª imagem) do vice do atual presidente norte-americano Donald Trump, J. D. Vance. Eita!


    O que mais me deixou alegre diante de um enredo familiar super complicado por causa do uso de drogas da mãe de J.D. Vance é que ela está limpa há algum tempo. Depois de Eu, Cristiane F, 13 anos, drogada e prostituída  ou Só por hoje e sempre (biografia Renato Russo) e a atualidade desses personagens (o que me deixa triste), claro que saber que que B. Vance (mãe) continua na luta me dá esperança. O filme não ultrapassa a fase do vício. 


     Voltemos a Glenn Close, que atuação! Gente, o que seria de J. D. Vance sem a ação dessa avó? Quanto de culpa ela leva na criação de B. Vance? Não sei. A decisão foi dele e com muita dificuldade está lá, sendo visto. Sabemos que o enredo poderia ter sido diferente, como de muitos que seguem nesse contexto familiar de dependência química. Antes de finalizar, olha essa foto e a semelhança entre a personagem real e a Glenn que faz o papel da avó. 


INDICO!

domingo, 20 de abril de 2025

TEA - Um guia resumido

 


    O livro também foi comprado pelo mesmo motivo citado na postagem anterior e também é um copilado de capítulos escritos por vários especialista na área da Educação. O capítulo I aborda sobre a importância do mapeamento genético para identificar mutações específicas que estão associadas ao TEA. O capítulo foi escrito por Amanda Leal, especialista em área inclusiva, Terapia Cognitiva Comportamental, desenvolvimento infantil e Terapia ABA. 

    Para mim, que já li muito sobre TDAH e quase nada sobre TEA, o livro me trouxe mais informações novas sobre o tema. O capítulo sobre Mães de Autista Severo (TDI): dores ocultas escrito por Maria Gorete, psicóloga clínica e especialista em TCC, ABA e Autismo descreve sobre o papel das mães e como necessitam de suporte. Fiquei um pouco em dúvida porque a autora coloca a sigla TDI no título e tive que reler algumas vezes para entender a conciliação entre  autismo severo e Transtorno Desintegrativo da Infância (TDI). Bom, não vou explanar o que entendi com receio de explicar errado, mas vou pesquisar mais. No final do capítulo tem endereços de Ong´s de apoio para famílias com autistas. 

    Novamente o capítulo que mais gostei foi da profissional Ana Cordeiro (que citei na postagem anterior) Fundamentos Filosóficos da Análise do Comportamento. No capítulo temos os princípios básicos da análise comportamental aplicada (ABA) que não é um método de trabalho e sim uma ciência muito interessante. Tudo é comportamento e comportamento é tudo o que fazemos. Bom, eu indico muito esse capítulo ou um aprofundamento no tema. Achei sensacional!

    A doutoranda em Educação Deise Saraiva escreve sobre Caminhos para inclusão na Igreja Cristã, tema que eu achei muito pertinente. Ela explana a técnica C.E.A.M e demonstra procedimentos possíveis para auxiliar o membro autista na programação religiosa. Nesse capítulo que conheci o termo Teoria da Mente, ausente em pessoas com autismo. 

    O livro é um bom pontapé para o aprofundamento do tema tão urgente na área educacional. Não é um guia completo, mas em nada diminui a possibilidade em acrescentar na nossa área educacional. Também da Editora APMC. 

TDAH - Um guia resumido


    Comprei o livro após uma excelente capacitação profissional com a neuropsicopedagoga Vanísia Rocha. Deixo o site dela aqui como indicação Vanísia Rocha. A profissional escreve apenas em um capítulo, pois o guia possui capítulos escritos por vários autores. São capítulos curtos que não se aprofundam na temática e possuem referências bibliográficas. Fiz várias pesquisas após a leitura. 

    O capítulo que mais gostei foi Impactos Gerais do TDAH na fase adulta escrito pela pedagoga Ana Cordeiro, inclusive coordenadora editorial desse livro. O capítulo Contextualização e orientações básicas acerca do TDAH em crianças também é escrito por ela, que informa sobre os tipos de transtorno e dá algumas dicas de adaptações para evitar comportamentos indesejados. 

    Achei muito necessário o capítulo Transtorno de Humor ou Déficit de Atenção e Hiperatividade? escrito por Gilmara Sousa. Ela usa o exemplo de um diagnóstico em uma criança que passava por uma situação específica e que acabou refletindo em seu desenvolvimento escolar. Antes de qualquer diagnóstico fechado, foi realizado uma pesquisa desde a gestação até o contexto familiar. Rastreamento neuropsicológico e social, muito necessário diante dessa onda de diagnósticos e medicação na infância. 

Outro tema muito importante é  O TDAH e a importância do Plano Educacional Individualizado. Ainda que exigido, muitas escolas não construem o PEI e não adequam o ensino para alunos laudados. O capítulo foi escrito por Thamiris Batista, mestra em Educação, pedagoga, Psicopedagoga e Especialista em Neuropsicopedagogia, Educação Especial e Análise do Comportamento Aplicada. 

    Não que os outros capítulos não sejam importantes, mas registrei aqui apenas aqueles que eu gostei. Uma leitura possível nos dias corridos, mas repito que resumido, por se tratar de capítulos de autores diferentes. A Editora é a APMC e achei pouco material sobre livros, autores e editora. Tanto que a imagem é do livro que adquiri. Indico a leitura. 



 

sábado, 19 de abril de 2025

Uma História não contada - Petrônio J. Domingues


    Comecei a ler o livro Uma História Não Contada: negro, racismo e branqueamento em São Paulo no pós-abolição em setembro de 2020. Finalizei agora (abril/2025), afinal não é uma leitura para "devorar" e sim pesquisar, analisar, refletir e compartilhar. O autor, Petrônio José Domingues, é professor e historiador especializado no estudo da História do Brasil pós-abolição. O livro aborda exatamente o racismo construído no pós-abolição em São Paulo.

    O abolicionismo de cunho institucional, sistema escravista insustentável e aumento de consciência e articulação de luta em suas várias formas da população negra resultaram na abolição da escravatura. Quem assinou a Lei não possuía uma política reparadora para os ex-escravos e nem um plano para a transição do trabalho escravo para o trabalho livre. O problema da mão de obra era um dos principais assuntos, principalmente em São Paulo. 

    Um mito da historiografia e discurso da classe dominante agrária paulista era que havia uma quantidade insuficiente de mão de nobra no País e para suprir essa questão, era necessário a entrada dos imigrantes brancos europeis. Surgia uma força total na substituição étnica da força de trabalho que repelia os ex-escravos. 

    O racismo à paulista no pós-abolição era diferente daquele convencionado de padrão brasileiro. Havia uma política de exclusão do negro que impedia o desfrute dos mesmos direitos civis assegurados aos brancos. A segregação não era oficial, mas consolidada pelos usos e costumes que atingiu todas as instituições da vida social. A prática violenta da polícia, a exclusão nas instituições religiosas e a negação educacional fortalecia fronteiras, preconceitos e discriminações.

    O livro também explana a formação das  associações beneficentes, atividades desportivas, hospitais, asilos, escolas e lazer no pós abolição em SP. Muitas ações a partir de agrupamentos imigrantes, porém sem êxito. Uma dificuldade, uma ausência, uma lacuna que respiga até os dias atuais. Leitura super indicada e com vasto material bibliográfico que respalda o autor em números para os fatos abordados. 



Literatura nas animações do Studio Ghibli (Parte I)

     Citei na postagem anterior sobre a relação entre o título japonês da animação O Menino e a Garça (título internacional) com o livro How Do You Live? (Como você vive?) do autor japonês Genzaburo Yoshiro (1899-1981). Uma das características do Studio Ghibli, fundado em 1985, é a forma como os diretores adaptam obras literárias em suas produções. Como sigo em minha pesquisa acadêmica, achei pertinente compartilhar algumas informações, ainda mais aquelas de cunho ocidental (tema do meu TCC já explanado em outras postagens). 

    Vou começar com Nausicaã do Vale do Vento (1984) que eu ainda não assisti, pois sigo acreditando que vou conseguir ler todos os mangás que foram produzidos entre 1982 a 1994. Só li o volume 1. Oremos! O nome Nausicaã foi escolhido por Miyazaki por causa da princesa de Feácia do livro Odisseia de Homero. Conheco a obra e super indico. Fiquei me perguntando o que teria feito Hayao escolher essa personagem. Devaneios de Sally. No quesito personalidade, Nausicaã tem por referência o conto do folclore japonês A Princesa que amava insetos. Só uma curiosidade, li algo a respeito sobre Rey (Star Wars) e Nausicaã, deixo aos interessados o link Influência Japonesa em Star Wars

Ulisses e Nausícaa, de Michele Desubleo (1602-1676)

    Túmulo dos Vagalumes (1988) produzido pelo diretor Isao Takahata (1935-2018) é considerado o filme mais triste do Studio Ghibli pela maioria dos fãs. Concordo plenamente. O filme foi baseado no livro Hotaru no Haka (1937) do autor Akiyuri Nosaka (1930-2015) e a obra literária é sobre a vivência do escritor durante a 2ª Guerra Mundial. Sua cidade Kobe foi bombardeada em 1945 pela bomba B-29 e sua irmã faleceu de fome. Ele publica o conto que se torna depois um romance biográfico para se desculpar com a irmã. 

Cidade de Kobe antes do bombardeio

    O serviço de entregas da Kiki (1989) do diretor Hayao Miyazaki foi baseado no livro infantil Entregas expressas da Kiki da autora Eiko Kadono. Ela se baseou em um desenho de sua filha  de uma bruxinha com uma vassoura voando no céu escutando um rádio. Kiki tem 12 anos assim como a filha de Eiko Kadono e seu único poder é voar em uma vassoura. Seus problemas devem ser resolvidos com auxílio da sua inteligência. 

Eiko Kadono

    Na animação japonesa, Miyazaki aborda a passagem da infância para a juventude e sobre a superação da personagem Kiki desenvolvendo a sua capacidade longe orientação familiar e sem o poder da vassoura durante um tempo. Duas abordagens maravilhosas sobre a pré-adolescência feminina. Devaneios de Sally. Ah! As aventuras literárias de Kiki acontecem em 8 títulos, enquanto a animação se baseou apenas no primeiro volume. 


mangá Omoide Poro Poro

    Não achei muita informação sobre o mangá que foi a inspiração para o filme Memórias de Ontem (1991) do diretor Isao Takahata (1935-2018). Com o título Omoide Poro Poro, o mangá foi escrito por Hotaru Okamoto e ilustrado por Yuko Tone (também não há muito material na internet em português). Achei um podcast muito bacana no spotify no #96 no canal OverDriver Spotify Podcast e eles até começam o episódio informando que é uma animação pouco falada no universo Ghibli. 


    O interessante do enredo é que explana o Período Shôwa (1926-1989) e como era geral esse sentimento de nostalgia e busca por identidade em um contexto cultural e social que vivia a personagem Taeko Okajima (alter ego da autora Hotaru Okamoto). Mais interessante ainda o fato que Isao Takahata acrescentou uma adulta de 27 anos, solteira e que vivia em Tóquio para relacionar o tempo narrativo entre presente e passado. Foi um tema inédito na época e bem aceito pelo público. Interessante que nas animações do Studio Ghibli o campo é visto como o tradicional e em Memórias de Ontem vai demonstrar esse contraste entre passado e modernidade. 

To be continued 


O menino e a garça - Studio Ghibli (Parte I)

 


    Assisti O menino e a garça (2023) assim que saiu na plataforma de streaming Netflix.  Deixo bem claro que assisto as produções do Studio Ghibli com toda uma preparação  acadêmica (pesquiso antes e depois), pois o estúdio faz parte do meu artigo final na graduação de Artes Visuais. Por mais que eu esteja escrevendo sobre o encontro cultural Ocidente/Oriente dentro de uma sociedade tradicional japonesa em apenas uma animação (A viagem de Chihiro), tenho a pretensão de analisar toda (ou quase toda) a produção do estúdio. 

    Não pretendo (e nunca pretenderei) aqui escrever algo novo diante do oceano de informações que temos sobre o estúdio, diretor, histórico cinematográfico e etc. Apenas explanar minhas surpresas sobre a animação e que tudo que Miyazaki consegue mesclar (cultura ocidental e oriental) em suas produções. Para começar, O menino e a Garça, é mais uma animação semi-autobiográfica, mas com uma mudança bem significativa, o protagonista é do sexo masculino. Após a minha leitura limitada (oceano de informações), podemos afirmar que Hayao Miyazaki é Mahito Maki, um menino de 12 anos que acaba de perder a sua mãe em consequência da 2ª Guerra Mundial (1939-1945). Seu pai (Shoichi) também trabalha com a produção de aviões e há na animação um deslocamento da cidade para o campo (ou de localização) assim como Meu amigo Totoro (1988)  e A Viagem de Chihiro (2001) como início da narrativa. 


    Só uma observação, conhecemos a animação japonesa com o nome O menino e a Garça, mas sua tradução (Kimitachi wa Dõ Ikiru ka) tem relação com o título do livro lançado em 1937 e escrito pelo autor Genzaburo Yoshiro (1899-1981), How do you live? (Como você vive?), um dos livros preferidos do diretor/produtor/fundador do Studio Ghibli. O material literário trata do personagem Koperu que aos 15 anos perde o pai e vivencia o amadurecimento diante do luto. Talvez justifique um pouco a escolha de Miyazaki colocar um protagonista masculino. Devaneios de Sally. 


    A produção da animação teve início em 2016, após a terceira ou quarta aposentadoria de Miyazaki. O título foi anunciado em 2017 e a sua produção foi finalizada em 2022 (levando em consideração o próprio tempo do diretor e a pandemia COVID). Em maio de 2020 foi anunciado que 36 minutos do filme haviam sido desenhados à mão por 60 animadores (O que torna a atual trend IA/Studio Ghibli uma "afronta à vida" #entendedoresentederão). Foi o filme mais caro já produzido no Japão, segundo Toshio Suzuki (cofundador, diretor e produtor do Studio Ghibli e aquele que tem a coragem de discordar de Miyazaki). 

    No seu lançamento não teve todo o marketing tradicional, e, sim apenas a divulgação de um pôster. Ainda assim ganhou o Oscar (96ª edição) de Melhor Animação em Longa-Metragem  (2024), segunda premiação que o diretor ganhou em vida após 21 anos (O Longa A Viagem de Chihiho ganhou o prêmio em 2003 sendo o primeiro filme de língua não inglesa a levar a premiação).Cito o Oscar por ser o mais conhecido e divulgado, mas o filme teve muitas outras premiações. Bem merecido! 

"To be continued"




terça-feira, 15 de abril de 2025

Como ganhar milhões antes que a vovó morra - Pat Boonnitipat

 


 Como ganhar milhões antes que a vovó morra (Lahn Mah) é um filme de comédia tailandesa de 2024 que teve grande aceitação na Ásia e agora chegou na plataforma de streamming da NetflixA maioria das páginas que contém a sinopse do filme informa (na minha opinião) erroneamente que um jovem abandonou um emprego para cuidar da avó. Bom, eu não entendi que ele tinha um emprego, mas que era um alienado no lucro que poderia obter sendo gamer enquanto sua mãe trabalhava e sustentava a casa de forma sobrecarregada. 

    M., o neto de Mengju, participa do Festival Qingming (pesquisei) com o núcleo familiar formado por: tio mais velho (o preferido e mais bem sucedido da avó), sua esposa e filha; o tio do meio (irresponsável e sem dinheiro) e a mãe. Nessa visitação ao túmulo, percebemos a distância entre as gerações. A avó cobra os procedimentos certos diante da tradição de visitar e celebrar os mortos, mas o neto jovem apenas se atenta ao jogo online e ninguém parece desejar estar ali.

    Após a morte do parente da sua prima e sabendo que a casa foi deixada para ela após cuidar do falecido doente e idoso, M. começa a se interessar em cuidar da avó doente com a esperança de receber a casa como recompensa. Inclusive ele conta que ela está com câncer no intestino, algo que a família não havia até então contado. Eis o enredo resumido, daqui em diante não vou me aprofundar para não dar spoiler. 

    Para M. há uma grande necessidade de ganhar dinheiro rápido e se amparar em plataformas digitais para tal. Ele quer ser influenciador game; sua prima após ser herdeira da casa, faz conteúdo adulto como enfermeira; seja como for, a mensagem é: PRESSA! Como esse conflito é passado na longa metragem? Percebemos uma avó que respeita etapas, procedimentos e detalhes. M., diferente dela, quer esquentar uma água no microondas pois é a mesma coisa da água esquentada na chaleira. Tem outros exemplos no decorrer da convivência dos dois dessas diferenças em fazer e enxergar o mundo.

    M. não cultua nada, não acredita na religião da sua avó, não entende porque ela deixou de comer carne para pagar uma promessa para uma deusa que curou o seu filho mais velho, não entende a importância de ter um caixão a ponto da avó ser humilhada pelo próprio irmão. Com o passar do tempo, mesmo não sendo religioso, M. começa a refletir sobre valores da vida. 

    As imagens também proporcionam a análise sobre o velho e o novo. Casas antigas e prédios altos compõem a cenografia para informar que ambos coexistem no mesmo lugar. M. se adapta na casa da sua avó com TV de tubo, chaleira, guardar dinheiro no armário. Enquanto isso, Mengju, consegue ao menos usar um filtro no aparelho telefônico. Aos poucos, o novo cede e o tradicional ensina explicando a importância dos ritos, do sagrado, da tradição. 


    Com uma leveza poética, o drama ensina com o auxílio do humor, necessário pelo peso do tema, que valores podem ser adquiridos e que a passagem do bastão de uma geração para a outra pode ser realizada de fato. Todos são humanos, todos ali também estão presos pelo peso da tradição não compreendida (geração dos filhos de Mengju), todos ali também sentem uma amargura que determina comportamentos. Não há vilões. M. faz parte da nova geração que indaga, que a princípio tem um objetivo sórdido, mas, que, por ter a coragem de perguntar e criticar, obtém as respostas. Elas que possibilitaram a sua mudança. Indico com a pipoca e lencinhos de papel. Lágrimas e risadas garantidas. 


segunda-feira, 14 de abril de 2025

O quarto ao lado - Pedro Almodóvar


Eu ando pelo mundo prestando atenção
Em cores que eu não sei o nome
Cores de Almodóvar (Adriana Calcanhotto)

    Devo começar informando que muitas críticas que li sobre o filme O quarto ao lado de Pedro Almodóvar, citaram a ausência das ditas cores tão presentes em seus filmes. Incrível que foi a primeira coisa que percebi, pois uma das características do diretor é usar das cores para transmitir o humor do personagem/situação. Elas estão bem presentes, mas de uma maneira mais "outono", digamos assim. Bom, não vou dar muitas informações técnicas sobre o filme, só resumir em: Julianne Moore e Tilda Swinton. Já é o bastante para você confiar que vai ser interessante. Um diretor genial e duas atrizes fenomenais. Acrescento que é baseado na obra literária de Sigrid Nunez "What we are going through" (O que você está enfrentando) e é a primeira produção em inglês. 

    Bom, duas grandes amigas do passado, Ingrid e Martha. Trabalharam juntas e bem íntimas... na época. Pausa no relacionamento dessa amizade por um distanciamento de tempo e espaço. A primeira se tornou uma escritora famosa e que em seu último livro debate o tema da morte, algo que ela não compreende. A segunda, reporter de guerras que vivenciou muitas tragédias e mortes. As duas tem bagagem cultural e isso vai ser debatido em vários momentos do filme. Martha está vivendo a sua própria tragédia pessoal: um câncer. Após participar de tratamentos como cobaia toma uma decisão a qual envolve Ingrid, a eutanásia. 

    A partir de agora não vou mais falar do enredo, apesar de ser digno de reflexão, afinal é um filme que cita aquecimento global, mundo pós pandemia, solidão, amizade, pessimismo, otimismo, morte e afins. Agora em diante serão as minhas próprias reflexões. Eu detestei Martha. Isso parece algo cruel, afinal é ela que está morrendo e a morte tem esse poder de absolver tudo e todos. Martha tem um conflito com a sua filha e ela tem um motivo para tudo o que fez. A filha ausente em um momento tão delicado e Martha querendo poupá-la, só fortalece a "bondade" da mãe abandonada, que, se analisarmos bem, abandonou a filha ao viajar tanto. 

    O que fortaleceu a minha opinião sobre ela foi a fala do seu ex-contato físico e sexual, Damian (John Turturno), para Ingrid (que também se relacionou/relaciona com ele em um outro formato mais "humano"). Martha tinha pressa em suas relações íntimas e ele chega a citar a palavra "terrorismo". Mas se dermos um maior zoom, ele não é tão diferente de Martha na sua racionalidade diante da vida e da morte. Por isso que será ele o responsável em achar uma advogada para Ingrid. A escritora sempre transfere essa racionalidade para "não quero falar sobre isso agora" ou "vamos falar sobre isso depois". O melhor diálogo foi entre ele e Ingrid:

"Perdi completamente a fé de que as pessoas façam a coisa certa". Damian

"Há muitas formas de viver dentro de uma trágedia" Ingrid 

    Sobre Ingrid, sei que pessoas assim existem. Me refiro a grandeza do seu coração. Mas eu tenho a sensação que foi mais por não saber dizer "não". Martha em certo momento disse que sabia do sucesso da amiga escritora. Por que nunca ligou? Por que as duas não se mantiverem conectadas? Sei que a vida moderna faz mulheres com carreiras de sucesso tomarem decisões dificeis no campo da maternidade e relacionamentos. Sei também que é mais uma das provocações reflexivas do diretor. Mas a frase de Ingrid mediante a informação da câncer da amiga "como eu não fiquei sabendo?" me faz pensar que não eram tão íntimas assim para Ingrid ter que aceitar a escolha da amiga. Ela não foi obrigada, mas a partir da primeira visita teve a sua vida transformada e foi entrando de novo na vida de Martha a partir de pedidos da amiga doente, não por iniciativa própria. 

    Claro que existiam outras amigas que negaram o pedido de Martha fazendo de Ingrid a última opção. Será que era apenas porque Ingrid deixava claro em suas obras que tinha medo da morte? Ao meu ver, qualquer amiga servia.  Volto a repetir, não eram mais íntimas e ela nem sabia do câncer.  A forma como ela passa a agir para colocar o seu plano em ação,  a forma como só pensa em si mesma e passa a justificar como consequência da doença e tratamento, ignorando os sentimentos de Ingrid só reforçaram a minhã visão dela como EGOÍSTA. 

    Deixando de lado o que eu nem chamo de análise, mas apenas de devaneios pessoais, claro que é um filme digno de debate e vinho. As possibiidades de um filme tão curto são dignas de reuniões semanais para pincelar cada item gerador de reflexão. Até o local ambientado em Nova York me pareceu um pouco provocador, já que a cidade norte-americana é uma excelente referência para vida acelerada e líquida. Só é possível parar para refletir em uma situação como a de Martha? Bom, mais um devaneio pessoal. 

    Finalizemos com Edward Hopper e as referências do artista na casa escolhida por Martha. A fotografia total dessa casa nos dá uma sensação de ser a obra cinematográfica dentro de um quadro pintado por Hopper. Aliás, suas obras abordam finitude, contemplação, solitude e sentimos uma mesclagem de Hopper e Almodóvar na seleção de cores. Genial. Há muitas referências literárias, cinematrográficas, musicais e até guerras. Não é um filme simples para quem não conhece todas as citações, porém, possível. 

    Claro que indico para uma abordagem na psiquê humana sobre como enfrentar o fim e como lidar com as questões que deixamos para depois e esse depois chega. Martha acaba transferindo para Ingrid o depois "mãe e filha" - "ela nunca me contou isso sobre o meu pai". Ingrid recebe como presente, talvez a amiga já soubesse disso. Martha lidava com guerras, mas não conseguia lidar com o conflito entre ela e a sua filha. Deixou apenas uma carta para a amiga e uma para a polícia. Para a filha, bens materiais. No quesito das escolhas, bem sabemos que nem todos podem desistir em nome da dignidade diante do óbito e que a grande maioria não tem material poético elitizado para ser paliativo diante da finitude da vida. Mas como bem disse a personagem Ingrid "há várias maneiras para se viver dentro de uma tragédia". Ninguém está imune a passar por elas. 

*é a minha primeira impressão após assistir o filme. Depois de conversas com amigas e reflexões, sei que algo vai mudar (ou não) sobre Martha. Ninguém atravessa uma ponte sozinha quando o assunto é relacionamento e o outro decide por muro. Escrevo em outra postagem qualquer mudança de opinião.