quinta-feira, 29 de janeiro de 2015

Diário literário janeiro/2015 Parte VI

10/2015 A festa da insignificância - Milan Kundera (2014)

Capa brochura, 136 pgs, Companhia das Letras, 2014

Tenho Kundera gravado no corpo, literalmente. O conheci por uma frase solta que me levou a tatuá-la no corpo e a conhecer sua mais conhecida obra "A insustentável  leveza do ser". Na obra, que relata o triângulo amoroso entre Tereza, Sabrina e Tomaz, percebi que o autor cita situações históricas que o afetaram diretamente. Logo, depois de várias resenhas lidas sobre as obras do autor, achei por bem ler uma biografia confiável antes de ler outro romance. Mas, após indicação (normalmente não acompanho lançamentos e costumo sempre ler livros após anos de publicação) me senti curiosa em ler uma obra escrita após mais de dez anos de silêncio.

Após ler várias resenhas (prática que tenho antes, durante e depois da leitura) percebi que seria interessante ler um pouco mais sobre o autor, pois se trata de um elo entre ele e o leitor. Levando em conta que o autor não dá entrevistas e que o material virtual é repetitivo sobre sua biografia, tenho pouco a citar sobre Milan. Foi expulso do Partido Comunista, tem ódio ao comunismo linha dura, está exilado na França desde 1975 e suas obras têm sempre algo relacionado com sua vida. Sobre as resenhas atuais da obra em questão, ainda é cedo para criar algo exclusivo, parecendo todas (inclusive a minha) a soma de alguma ou a resenha genérica de outra. Não há muito a se fazer. No silêncio do autor sobre sua intenção, não adivinhamos, apenas deduzimos a partir das nossas conclusões. 

Milan Kundera

A obra é um romance filosófico que faz ponte entre Paris dos dias atuais e a União Soviética do passado. No início, o personagem Alain (possível alter ego do autor) passeia pelas ruas parisienses e reflete sobre os centros da sedução feminina na visão dos homens ou das épocas. No passado, esses centros foram a coxa (caminho), a bunda (o caminho mais curto em direção ao objetivo) e os seios (santificação da mulher), mas na geração atual o centro da sedução feminina é o umbigo. Questionando o motivo para tal, esse tema "umbigo" será tratado mais de uma vez na obra, tendo o questionamento respondido no final da obra:

 

O amor, outrora, era a festa do individual, do inimitável, a glória do que é único, do que não suporta qualquer repetição. Mas o umbigo não só não se revolta contra a repetição, é um apelo às repetições! Vamos viver, no nosso milênio, sob o signo do umbigo. Sob este signo, somos todos, tanto um como outro, soldados do sexo, com o mesmo olhar fixo não sobre a mulher amada mas sobre o mesmo pequeno buraco no meio da barriga que representa o único sentido, o único fim, o único futuro de todo o desejo erótico. (125)

 

Fica óbvia a primeira crítica ácida do autor sobre a geração da atualidade, a uniformidade. Para o autor a individualidade é uma ilusão. Mas, esse individualismo é abordado também de outro ângulo, daquele que trata como insignificante o outro e entra na dança das culpas:

 

"Se sentir ou não se sentir culpado. Acho que tudo depende disso. A vida é uma luta de todos contra todos. (...) Em vez disso, tentam jogar no outro o constrangimento da culpabilidade. Ganhará aquele que conseguir tornar o outro culpado. Perderá aquele que reconhecer sua culpa. (...) você também pertence ao exército dos desculpantes. Pensa que vai agradar o outro com suas desculpas. (...) Quem se desculpa se declara culpada. E se você se declara culpado, encoraja o outro a continuar te injuriando, te denunciando, publicamente, até sua morte. São as consequências fatais do primeiro pedido de desculpas." (54)

 

Podemos dizer que o autor pegou pesado com a caneta. Alain, além da sua relação imaginária e idealizadora que tenta justificar a rejeição da sua mãe por ele, tem uma namorada chamada Madeleine. A moça aparece uma vez, e fica outra ácida crítica da sociedade atual, a desinformação. Não conhecendo quem foi Stálin, o autor indica a falta de pertencimento ao desconhecer ou se interessar em conhecer o passado. A perca de tal conhecimento leva pessoas ao desinteresse político e a não participação do destino da sociedade. Vale refletir sobre o pileque homérico dos jovens atuais, levando em conta que Milan foi um estudante ativista político.

Falando em Stálin, ele aparece em várias vezes (não como personagem), o que a princípio pode ser complicado de entendimento. Charles, segundo amigo citado (são quatro ao todo, os demais são secundários) lendo as memórias de Nikita Khruschóv aos amigos relata a piada das perdizes contada por Stálin. Só que, ninguém sabia que era uma piada. Ora, nada mais atual da nossa forma de levar a sério o que não é para ser levado. O mesmo personagem cria uma peça imaginária de marionetes que não vai colocar em prática. Cria em sua mente pois nada o distrai. Somos de uma geração que procura distração a qualquer preço. Então quero abordar sobre Ramon (terceiro amigo) e D´Ardelo

Ramon aparece no segundo capítulo (apesar que a obra é dividida em sete partes e não aparece a palavra capítulo) no Jardim de Luxemburgo e desisti de ver uma exposição de Chagall pelo tamanho da fila. No final da obra, linkamos com essa tendência a qualquer coisa para nos distrair, quando Ramon desiste novamente da exposição pelo mesmo motivo:

 

Você acha que, de uma hora para outra, começaram a gostar de Chagall? Estão dispostos a ir a qualquer lugar, a fazer qualquer coisa, apenas para matar o tempo com o qual não sabem o que fazer”. (123)

 

Ramon encontra D´Ardelo e esse mente sobre um câncer que não tem. O último sente prazer na pequena anedota, mesmo sem entender o motivo. Acredito que esse fato esteja no mesmo nível da criação da culpa no outro, a criação da empatia, da pena ou de qualquer coisa que nos deixe no centro do pensamento do outro. Sobre D´Ardelo, vale ressaltar também a presença de comportamento que anteriormente era presente apenas no universo feminino. A questão da idade:

"Já muitos anos antes, ele tinha começado a detestar aniversários. Por causa dos números que se colavam neles. No entanto, não conseguia esnobá-los, pois a felicidade de ser festejado superava nele a vergonha de envelhecer" (13)

Ramon entra em contato a pedido de D´Ardelo de Charles para organizar um coquetel de aniversário do mesmo. Conversando sobre esse com Charles, Ramon vai deixar pérolas sobre o brilhantismo, narcisismo e gêneses sobre a insignificância. Para Ramon, D´Ardelo é um sujeito narcisista que faz de tudo para ser o centro da atenção. Diferente do orgulhoso que subestima o outro, o narcisista vê no outro a própria imagem, então o superestima, sendo gentil a qualquer preço. Ele tenta ser um ser brilhante. 

Então entra na cena, Quaquelique, que consegue chamar a atenção fazendo silêncio. A insignificância o liberta de toda e qualquer competição e há inutilidade em tentar ser brilhante. Ressalto que D´Ardelo é o tipo de cara que na tentativa de ser brilhante, zomba, satiriza e usa de sarcasmo. Algo bem presente na sociedade atual e apresentado na atitude de Calibã (quarto personagem) que criou um linguajar para zombar dos convidados nos coquetéis que trabalha com Charles. Ramon mediante o medo de Charles ser descoberto na sua linguagem criada:

"O prazer da  mistificação devia protegê-los. Aliás, essa foi a estratégia de todos nós. Nós compreendemos há muito tempo que não era mais possível mudar este mundo, nem remodelá-lo, nem impedir sua infeliz trajetória para  a frente. Havia uma única resistência possível: não o levar a sério. Mas constato que nossas gozações perderam seu poder. Você se obriga a falar paquistanês para se divertir. Em vão. Sente apenas cansaço e tédio."

E sobre o tédio, inimigo da sociedade atual, Ramon o sente e procura bom humor para lidar com o mesmo. Em um diálogo com Calibã, cita Hegel em um estudo sobre o cômico. Repito o bom humor que é diferente de zombaria, sátira e sarcasmo. 

"Somente das alturas do infinito bom humor é que você pode observar abaixo de si a eterna tolice dos homens e ri dela". (90)

 

Voltando para Calibã (ator falido e seu nome é devido a um personagem que encenou de Shakeaspeare), quando percebeu que acabara o divertimento do seu linguajar criado, sentiu-se inútil. 

"... o sentimento de inutilidade de sua língua trabalhosamente inventada e a melancolia começou a invadi-lo" (64). 

 

Creio que não seja necessário dissertar muito sobre nossas criações para nos distrair e toda melancolia quando as mesmas perdem sua utilidade. Dá-lhe fluoxetina na geração do século XXI. Volto mais uma vez para citar Quaquelique, outrora citado, pois é paralelo ao tema aqui abordado. Ramon na obra fala que ele é um conquistador por seu silêncio e ausência de comportamento "brilhante". Não devemos por isso acreditar que o silêncio dele é a insignificância como essência, pois no final do coquetel de D´Ardelo o mesmo diz para Ramon:

Sabe, não tem nada pior que o tédio. É por isso que mudo de companhia. Sem isso, não existe bom humor!" (78)

Bom, acho que falei sobre quase todos os personagens. Sobre a presença de Stálin, não quero dissertar sobre a suposta "ternura" dele ao dar nome a cidade de Kaliningrado em homenagem ao seu amigo Kalinin e nem dissecar o problema de próstata do último citado. Preciso ruminar mais e ler mais sobre isso.

Kalinin

Mas, vale a pena descrever a ideia de Kant de "a coisa em si" e a de Schopenhauer. Para Kant, por detrás de nossas representações, encontra-se uma coisa objetiva, que não podemos conhecer mas que, apesar disso é real. Mas essa ideia é falsa. Não existe nada de real por detrás de nossas representações, nenhuma "coisa em si". Já para Schopenhauer, o mundo é apenas representação e vontade. Por detrás do mundo tal como o vemos não existe nada de objetivo, e que, para fazer existir essa representação, para torná-la real, deve haver nela uma vontade; uma vontade enorme que a imponha. (Vale a pena refletir, principalmente porque Stálin declara que impôs a vontade de todos à uma única vontade, a sua). 

O desfecho (apesar que ainda tem muito para refletir e personagens - a empregada portuguesa, madame La Franck, Julie, Kalinin, ...) se dá após uma apresentação nos Jardins de Luxemburgo e no diálogo de D´Ardelo com Ramon. O último (acaba confirmando o que citei sobre Quaquelique e o seu silêncio) afirma que a insignificância é a essência da existência. Que ela está conosco em toda parte e até nos locais onde não queremos vê-la. É preciso amá-la, até mesmo com sua inutilidade, pois ela é a chave da sabedoria, ela é a chave do bom humor. 

Lembre-se que Milan dialoga conosco na obra e é visível em três capítulo, então não se assuste se ele lhe causar um certo tédio nas últimas páginas. Com certeza, foi proposital. Digno de "leia novamente"!

Gostaria muito de dissecar sobre o episódio das perdizes, da tentativa de homicídio que virou assassinato (que vejo uma inclinação psicológica fortíssima), mas ainda é cedo para uma única leitura (do livro). Logo, essa resenha corre risco de edições. Não fiz como as demais, início meio e fim, pois se o autor não se sentiu na obrigação de linearidade, quem sou eu para me obrigar a fazer. Indico, com precauções. Um prévio conhecimento do autor e leitura de resenhas que não contenha spoiler. Espero que a minha não contenha, me esforcei para isso. 

quinta-feira, 22 de janeiro de 2015

Diário literário janeiro/2015 Parte V

Já falei anteriormente da minha aversão injustificável pelo escritor Paulo Coelho (recebido na Academia Brasileira de Letras em 2002). Li há vários anos atrás os livros Diário de um mago (1987) e O alquimista (1988), obra mais conhecida mundialmente. Mas, não existia nenhum motivo particular para odiá-lo, talvez a "opinião coletiva". Antes de mais nada, o cara tem a seu favor o número de vendas, mundialmente falando. Cito isso, pois li numa opinião virtual uma teoria para o grande mercado consumidor (brasileiro), onde a causa seria a sociedade atual, analfabeta literária e movida por programas televisivos. Mesmo elogiado por Umberto Eco, ele é ferozmente criticado. 

Não o defendo, até concordo com algumas críticas. No livro Os doze pecados de Paulo Coelho de Eloésio, concordo com alguns pecados (erros gramaticais, superficialidade, filosofia de botequim, inconsistência, principalmente quando o tema é Cristianismo). O Observatório Da Imprensa também deixou sua opinião sobre seus erros gramaticais. Paulo apenas afirma que Deus pode se manifestar na ausência de um "ç". Interessante que em uma entrevista em 2008 em São Paulo, o falecido Saramago (que amo!) falou "Não precisei ler Paulo Coelho para ficar mais sereno. Uma boa doença vale por toda obra do Paulo Coelho". Foi o suficiente para toda distorção e alfinetadas no autor. Saramago, recém recuperado na época de uma enfermidade que o impediu de vir ao Brasil lançar sua obra "A viagem do Elefante" na verdade criticou aqueles que buscam serenidade pela obra de Paulo Coelho. 

Lendo mais um pouco, vi que a maioria das demonizações do autor partem de sites cristãos, alguns apoiadas pela obra de Fernando Morais sobre Paulo Coelho (O mago). Fernando Morais cita um curso de Satanismo no início dos anos 70 ("Teatro e Educação em Mato Grosso) onde usava alunos como cobaias sem o consentimento dos mesmos, a indução sem sucesso de uma namorada à tentativa de suicídio, bate-papo com o capiroto, drogas e afins. Internado três vezes na casa de Saúde Dr. Eiras, passou por tratamento com eletrochoques e foi diagnosticado com "Síndrome de Estocolmo". O cara tem "o" passado.

Enfim, toda essa introdução para resenhar os três livros que fazem parte da trilogia "Em sete dias..." que, por causa do segundo na série, acabei me forçando a ler os outros dois. Confesso que meu foco por Paulo Coelho já passou, pois um dos pecados que concordo é a repetição de temas. Não tenho interesse em ler "Adultério" (2013) sua mais recente obra lançada. Não faço mais parte dos que criticam (e sua grande maioria nunca leu nada dele) mas também não faço parte da legião de fãs. Apenas li.






08/2015 -  Da trilogia, Na margem do Rio Piedra eu sentei e chorei (1994) é o primeiro. Vale ressaltar que os três encontram-se disponíveis em PDF. Não é obrigatório ler na sequência, eu mesmo descobri o primeiro e o último, por causa do segundo. Após a leitura (apenas 83 páginas), fiquei meio com cara de paisagem e até me sentido "contente" por não ter desistido. Poucas pessoas gostaram da obra. (Abrindo parênteses, a sequência trata de amor-morte-poder e sempre o lance de ter acontecido em uma semana, o suficiente para mudar nossa vida). Pilar consegue ser mais problemática que eu (será identificação!? Freud explica, não o sendo, apenas opino sobre a obra). Acredito que o amor só pode ser o do padre, que abre mão de certo dom em nome do amor por Pilar. Talvez Pilar seja a que precisa aceitar receber o amor. Uma mulher desconfiada, cheia de conflitos, impaciente e pena que não perdeu o moço (que maldade da minha parte). Devia ter começado escrevendo que eles eram amigos de infância e patatipatatá, mas foi mau. Me empolguei. Agora ... na boa ... que final mais sem noção da parte de Paulo Coelho. Que? Como assim? Hã? Tipo: ai que saco, cansei, vou terminar de qualquer jeito. Sem ofensas, desnecessário. Vou deixar um link de um resumo, pois não desejo que minha opinião castre ninguém de ler a obra. Apenas meu ponto de vista. Frases:

"Esperar dói. Esquecer dói. Mas não saber que decisão tomar é o pior dos sofrimentos"

"Mas você tem que estar por inteiro no lugar que escolher"

http://www.resumosetrabalhos.com.br/a-orlas-do-rio-pedra-sentei-me-e-chorei-paulo-coelho_1.html



07/2015 -  Verônika decide morrer (1998) foi traduzido em 69 línguas. Tem a versão cinematográfica que comecei a assistir depois da leitura, mas parei depois de 07 (sete) minutos. Hoje não perco meu tempo, não sou crítica cinematográfica, logo não preciso ficar apontando divergências entre obra e filme. "Não! Verônika não tinha depressão como no filme". Verônika tenta o suicídio por uma causa inespecífica para uma moça bonita, jovem, inteligente e que tem uma compreensão bem lúcida do mundo ao seu redor. Pode parecer melancolia, depressão, bobagem, mas o autor na obra deixa bem claro que não é depressão. Enquanto espera a morte, ela lê um jornal com a pergunta onde fica a Eslovênia, indignada ela escreve um texto sobre o tema para se distrair. Esse fato chamou a atenção do autor e por ter sido também internado na juventude, resolveu escrever sobre o tema. Verônika acaba em um sanatório chamado Villete, onde vai passar a espera da sua morte (recebe a notícia que seu coração ficou enfraquecido e não vai aguentar mais que uma semana) com os verdadeiros loucos. Não tão loucos assim. Temos o caso de Zedka (depressão) que participava de experimentos com alta dosagem de insulina e confesso que não sei do embasamento científico para tal e se no sanatório realmente havia essa prática. Escrevo isso, pois o diretor do sanatório era o pai de uma moça também chamada Verônika, amiga de Paulo Coelho, que acabou contando-lhe a história. Mari (síndrome do pânico e dotada de uma grande inteligência) e de Eduardo (esquizofrênico), que recebia tratamento com eletrochoques para perder parte da memória recente e voltar para o mundo particular dele. Algumas informações fornecidas e a história dos personagens te prende ao livro (lido em dois dias) e achei o final muito bom. Mesmo sem saber se o lance do vitriolo é verdadeiro. Dos três, o que eu mais gostei. Indico. (Link do livro em PDF).

Frases:

"Que o ser humano só se dá ao luxo de ser louco quando tem condições para isso".

"Quanto mais felizes as pessoas podem ser, mais infelizes ficam". 

http://www.bookbrasil.com.br/books/overonika.pdf




09/2015 - Terceiro e último, O demônio e a Srta. Prym (2000) tem lá suas partes interessantes. O final também ficou meio "toma lá, dá cá", mas a mensagem principal é o poder. Poder de escolha. Na cidade de Viscos aparece um estrangeiro com uma proposta ilícita. A personagem principal é Chantal (Srta Prym) e em troca de barra de ouros, o estrangeiro propõe que alguém deve morrer na cidade. Chantal que acredita na bondade do próximo e movida por crenças de Ahab acredita em sua cidade. Porém, até ela fica em dúvida sobre ela. Para o estrangeiro, que seguindo todas as regras e normas espirituais e humanas sofreu uma grande perda, o homem só é bom por medo do castigo. Com a influência de lendas celtas e protestantes e de um santo católico chamado São Savin (também citado na primeira obra da trilogia), ainda que tenhamos o bem e o mal em nós, o exercício é a escolha e o controle. Ninguém é bom senão o Pai, versículo de Lucas que foi utilizado, assim como o poema bíblico de Jó para justificar a escolha do povoado de Viscos. Para fazer o mal, legitimamos até com o ensinamento do bem. Assim como A Ceia de Leonardo da Vinci, ao usar o mesmo modelo para Jesus e Judas, o bem e o mal podem ter a mesma face. Achei muito válida a resenha do link abaixo. Mais completa.

http://www.moisesneto.com.br/estudo21.html

segunda-feira, 19 de janeiro de 2015

Diário Literário janeiro/2015 parte IV






06/2015 - Diário da Queda - Micuel Laub

Escrita por um autor brasileiro, Diário da Queda é uma obra de ficção e autobiografia. Gira em torno de três gerações de uma família judia e o foco é o trauma pessoal que cada integrante dessa família carrega. O avô do personagem central foi prisioneiro de Auschwitz, sendo esse seu trauma. Ao cometer suicídio, torna o ato o trauma do seu filho e pai do personagem já citado. Já o trauma desse é a participação em uma brincadeira de aniversário entre alunos judeus com um aluno não judeu, por nome João. Após essa tragédia, ele muda de escola, mas passa a agora a ser perseguido por ser judeu em uma escola não judaica. O autor vai misturando passado e presente e aborda o tema alcoolismo, citando também o livro até então por mim desconhecido "É isto um homem?" Primo Levi. Temas conflituosos, mas escritos com leveza e possíveis de trabalhar até em sala de aula. 



05/2015 - Paixão Índia - Javier Moro

De ficção histórica, Javier Moro domina! (O Sari vermelho/As montanhas do Buda/O Império é você - lidos e bem apreciados). Paixão Índia aborda sobre o casamento e relacionamento entre Anita Delgado (espanhola) e o marajá de Kapurthala, Jagatjit Singh. Ela, com apenas 17 anos, bailarina e sem estudos, viaja para Índia e torna-se a princesa de Kapurthala. Não que isso significasse muito para ela dentro da Índia colonial e tradicional, pois não era a primeira esposa e tratava-se de uma ocidental. Mas, apesar de toda perseguição das demais esposas - que Anita desconhecia a existência quando viajou para Índia -, o marajá a trata com preferência, levando-a para suas viagens e eventos sociais. Como pano de fundo, podemos apreciar fatos históricos que envolveram a Índia sob o governo britânico, como a Grande Guerra e o processo de Independência da Índia. Logo, Gandhi aparece na obra. Também podemos analisar comportamentos excêntricos dos marajás indianos e o relacionamento que os mesmos possuíam com o governo britânico. Das viagens de Anita com o marajá, um fato me chamou muito a atenção. Me refiro ao romance entre John Walter (Lord Montagu) e sua secretaria Eleanor Thorton. Em sua homenagem, Lord Montagu encomendou uma pequena estatueta (The Whisper) para colocar no capô do seu Rolls-Royce, atitude que seria tomada por outros proprietários desse modelo de carro. A morte de Eleanor é citado no livro. São vários detalhes, fatos e comportamentos possíveis de conhecimento na obra. Inclusive o seu final identifica a situação atual da Índia após a sua Independência. Indico.





domingo, 18 de janeiro de 2015

Diário literário: janeiro/2015 Parte III


04/2015 - Ele está de volta/Timur Vermes


Classifico esse livro em uma única palavra: inteligente. Para primeiro romance, o autor não só está de parabéns como torço do fundo do meu coração que prossiga sua carreira literária. Ele está de volta! Ele quem!? Hitler! Adolf Hitler. Só que apenas os leitores e o personagem sabem disso. Não, não há em nenhum momento a defesa de Hitler sobre seus atos no passado, mas a exposição da sociedade atual e sua hipocrisia. A crítica ácida dos comportamentos humanos, da mídia, dos meios informativos boçais, do que pode ser considerado humor e do modelo político liberal-democrático. Claro, mesmo a Alemanha sendo o local do romance, respinga em todo o Ocidente. Detalhe: o cara saca muito de Hitler, lógico, estudou História (hihi). O tema não é fácil, nem simples, muito menos curado ("judeu não é tema para piada!"), mas ainda assim o autor consegue tirar bons risos do leitor ("cachorros e seus excrementos na rua"). Confesso que pela capa nem quis saber, mesmo estando na lista dos mais vendidos. Foi uma indicação insistente da "cazamiga" Amanda que, mais uma vez acertou em cheio. Super indico. 



sexta-feira, 16 de janeiro de 2015

Diário Literário: janeiro/2015 Parte II






03/2015 - A assinatura de Jesus/Brennan Manning
Já li alguns livros do Manning (O Evangelho Maltrapilho, O impostor que vive em mim e Colcha de retalho). A assinatura de Jesus nada mais é que a cruz do calvário e o sacrifício de Cristo em nossas vidas. Nesse livro o autor aborda assuntos como: O nosso ego (que é o equilíbrio entre Id e Superego, e para conseguir tal façanha, nada mais propício que render nosso ego diante da cruz); a igreja atual com toda sua erudição e apelo à emotividade; a fé que não deve residir apenas no intelecto ("Quando amamos alguém, mil argumentos não representam uma prova, nem mil objeções representam uma dádiva"); sobre o nosso chamado individual; sobre discipulado e discipulados; sobre como a igreja primitiva evangelizou apenas com o exemplo da comunhão que possuía entre irmãos ("As pessoas querem ser irmãos, sem antes aprenderem a ser filhos"); sobre a idolatria da autodepreciação (sim, uma forma de idolatria); sobre a oração e sua prática, mesmo diante da falta de vontade; sobre a segunda conversão, a noite escura (o sentimento que nos acomete de ausência de Deus); sobre exemplos de pessoas que começaram bem, fracassaram e atingiram o alvo de Cristo na caminhada (Pedro, Tiago e Filipe); sobre a necessidade de simplicidade em uma comunidade consumista e sobre as nossas emoções, que são boas, apenas precisam de amadurecimento na graça do Senhor (somos cristãos e não estoicos). Linguagem simples e vários exemplos e citações que enriquecem a mensagem do livro. Super indico.

quarta-feira, 14 de janeiro de 2015

Diário literário janeiro/2015 parte I



01/2015 - Como eu era antes de você/Jojo Moyes. 

Primeiro livro findado no tal de Kindler, que minha cazamiga Amanda me emprestou. A princípio fiquei receosa, meio "acho que a bateria pode acabar se eu levar no ônibus", "e o cheiro de livro novo!?" ou "e para ler o final, como faço vez em quando!?". Pura resistência. Você consegue levar "trocentos" livros de uma única vez. Me senti traidora no começo, mas passou. Quando li o título, lembrei de um comentário sobre "livros de menininhas", não me cativou muito. Porém, fui percebendo que havia ali um tipo de desemprego  e analisando o assunto acabei me apegando ao tema. Aliás, aos temas. Louise, ex-garçonete precisa ajudar aos pais na renda doméstica e isso implica em aceitar qualquer emprego. Logo eu discordo da maioria das resenhas virtuais sobre ela ser uma garota sem ambição. Era a realidade dela. Sua irmã, egocêntrica e narcisista, mãe solteira, também teve que trabalhar em uma floricultura. Em algumas pessoas como Lou, o que faltava era estímulo e não ambição. Então, aparece Will. Vítima de um atropelamento, ficou em uma cadeira de rodas. Era dele que Louise teria que cuidar, não como enfermeira, mas como acompanhante. Louise também tem um namorado, que diga-se de passagem, um nojo em pessoa. Com o relacionamento conturbado com Will, que devia durar seis meses, Louise começou a explorar outros mundos e tem diante de si a difícil missão de fazer Will desistir de dar fim a própria vida. Ótimas reflexões sobre o modo como deficientes são vistos e tratados pela sociedade e o polêmico tema "eutanásia". Leitura simples, não sei qual o problema em chamar de clichê, mas nos faz refletir sobre o outro e sobre todo potencial que o outro enxerga em nós, antes de nós mesmos conseguirmos enxergar. Super indico. 



02/2015 - Freud me segura nessa!/Laura Conrado


À primeira vista, parece uma cópia barata de Bridget Jones. Mas, logo elas se separam. Cat, desejava muito amadurecer, Bridget de forma distraída vai acertando os passos na vida. No primeiro livro "Freud me tira dessa", Cat se apaixona pelo analista, perde amores para outras (inclusive sua irmã) e resolve problemas com sua mãe. Desempregada, no segundo livro ela vai tentar a sorte em Nova York. De cara, um namorado e é aí que os problemas começaram. Ela então conhece a psicanalista brasileira Sofia e as conversas de consultório representadas no livro são ótimas. De fazer refletir. Com seu amigo Fernando, a atriz Emma e a puritana Candice, Cat divide o apartamento, a vida, as expectativas e como o leão (coragem), o homem-de-lata (coração) e o espantalho (Cérebro), a nossa Dorothy vai administrar os sonhos dos amigos (meio Amélie Poulien). Vale muito a pena. Clichê!? Talvez. Super indico.