domingo, 13 de setembro de 2020

O Alienista - Machado de Assis Parte I


Para dar início (depois de tanto tempo) a essa postagem, justifico que inseri essa imagem por achar intrigante a inclusão do autorretrato do artista francês Gustave Coubert. Possível conciliar seu estilo artístico realista, sem esquecer que ele foi contra a pintura literária, vinda da imaginação ou dos sonhos. O nome da obra é "Desespero". Enfim. Vida que segue. Só um adendo. 

Sobre a obra machadiana O Alienista (médico que tratava os alienados da época) não quero ser repetitiva sobre tudo que há no mundo virtual sobre o tema. Estou trabalhando Machado no artigo da minha Pós e me interessei por um curso que aborda Literatura e Loucura. Semana passada foi o Médico e o Monstro. Enfim. Vida que segue. 

O Alienista é um conto para a maioria e uma novela pela sua estrutura narrativa. Informação repetitiva sobre a obra. Publicado em 1882, eu acho. Não podemos esquecer o plano de fundo histórico da literatura machadiana sobre a sociedade do século XIX. Nem deixar passar batido sua  representação de costumes e transformações que ele vivenciou. Seu estilo é repleto de humor e crítica. 

Simão Bacamarte, médico que estudou em Universidades europeias importantes e de renome, não aceita propostas de regências e tal. Volta para Itaguaí, sua cidade natal no Brasil. A Medicina é a sua causa maior. Aí está a chave principal machadiana da obra. Uma elevação exagerada da forma que o médico se enxerga e a forma como exalta a Medicina. No período em questão fervilhavam as teorias científicas, principalmente o empirismo positivista. Não são raras as frases:

"Homem de Ciência, e só de Ciência, nada o consternava fora da Ciência"

"Imagem vivaz do gênio"

"Raro espírito que era"

Até mesmo a escolha da esposa, D. Evarista, demonstra a exaltação em questão, ele não importa com a beleza. Segundo a Ciência, as condições fisiológicas e anatômicas eram suficientes para dar-lhe filhos robustos, sãos e inteligentes. Não aconteceu. Após um vasto estudo sobre as causas e curas da infertilidade da "mulher" e a desistência do tema, começa a Odisseia de Simão em estudar na prática a  patologia cerebral. Isso pode ser um sintoma do final do conto (sem spoiler). O começo da sua empreitada. Aliás, a todo momento percebo que Bacamarte é perfeito aos olhos alheios, mas, para os olhos machadianos, há apontamentos interessantes de perceber no desenrolar do enredo. 

Bom, a Igreja está presente, claro. Seja sem o entendimento, "confessou desconhecer a existência de tantos doidos no mundo" (Padre Lopes); com as explicações bíblicas, "quanto a mim, só se pode explicar...segundo nos conta a Escritura"; ou pela crítica "isso de estudar sempre, sempre, isto não é bom, vira o juízo".Lembrando que a Igreja cuidava em sua grande maioria das caridades aos "dementes" da época. Quando não, a própria família trancava em uma alcova, na própria casa até a morte. 

Dementes. Qual seria a medida de Bacamarte para incluir na Casa de Orates/Casa Verde os seus estudos empíricos? Tudo aquilo que era considerado fora do padrão social da época. Sem querer descrever a história da Loucura, vou citar casos como: furiosos, mansos, monomaníacos, loucos por amor, delirantes, alucinados, todos aqueles considerados mentecaptos para o médico. Com a fusão de tratamentos medievais (sanguessugas) e tratamentos (modernos) paliativos, medicamentosos e influências estrangeiras (literatura árabe e lusitana), ele buscar a causa e a cura. 

Igreja, política, ciência, sociedade tudo na linha tênue entre loucura e sanidade. Se antes, comportamentos excêntricos e até pobreza eram diagnosticados como loucura, agora a presença de bons costumes é a causa máxima a ser estudada na Casa Verde. Como permanecer moral, piedoso, benevolente, honesto, ... em uma sociedade corrupta e corruptível? (atemporal). 


Muito a dialogar sobre o tema. Por ora, apenas uma degustação.