segunda-feira, 17 de dezembro de 2012

Retrospectiva literária 2012 (parte III)






Identidade alheia
Tertuliano Máximo Afonso é um simples professor de História e se encontra entediado com sua rotina. Divorciado, mantém uma relação não formal com a funcionária de um banco, Maria da Paz. Esta, que mora com sua mãe, procura de todas as formas uma decisão da parte do professor. Há muitos conflitos nessa relação, assim como, na relação com a sua mãe, dona Carolina e o seu senso comum, que visita-o nas horas mais inusitadas. Os vários diálogos que acontecem no decorrer da trama são muito interessantes e fazem valer a pena a leitura.
A mudança na vida do professor acontece quando seu colega de trabalho, o professor de Matemática, indica um filme segunda classe. Para surpresa de Tertuliano, o balconista/ator é sua cópia física mais que fidedigna. Depois disso, há meias verdades e mentiras inteiras para desvendar esse mistério. Em uma época de iniciação à informática, o trabalho de pesquisa foi minucioso.
Após uma busca, Tertuliano finalmente descobre Antônio Claro. Após o primeiro encontro, a paz se tornou distante para ambos. Para piorar a situação, Antonio Claro decide passar a noite com Maria da Paz, que infelizmente não foi contemplada com a verdade inteira. Sem ter o que fazer, Tertuliano não apenas permite, como empresta documentos e roupas para Antonio. Seguindo a Lei de Talião, passa a noite com Helena, esposa do seu sósia. Com todas essas capacidades humanas de ação, a identidade se confunde com a semelhança física e a mais prejudicada nesse labirinto cretense foi Maria da Paz. Pagou com a própria vida.
Agora, o que se achava duplicado, sendo único, tem que assumir a identidade alheia e perder a sua. E Helena, a frágil que vivia na base de remédios, é aquela que acaba dando a solução e desfecho final. Porém, quantas cópias duplicadas ainda terá Tertuliano, agora Antonio Claro, destruir? 





Sobreviver à perca
"O luto diz quem você é sozinha", é a frase que achamos na introdução do livro "A memória de uma amizade eterna" de Gail Caldwell. A autora decidiu escrevê-lo para relatar o início da amizade com a também escritora Caroline Knapp e desabafar a dor por sua perda.
Gail é uma mulher do Texas, gosta de nadar, viver isolada e tinha uma cachorra Clementine. Caroline era mais nova que Gail, filha de um psicanalista e uma artista introvertida,remadora apaixonada e também tinha uma cachorra, Lucille. O que as duas tinham em comum além da paixão por seus animais de estimação era o alcoolismo e a luta contra a dependência, já superada no início da amizade. Gail veio de uma família onde todos bebiam e Caroline além do alcoolismo também teve que vencer aos 20 anos a anorexia.
Os primeiros capítulos vamos conhecer o início e a consolidação dessa amizade, assim como o crescimento do afeto que uma sentia pela outra. Vamos conhecer suas características, os conflitos em uma amizade por suas diferenças e as semelhanças que as unem. Depois a autora relata as causas da sua dependência alcoólica e o árduo caminho trilhado para deixar de beber. Rodeada de pessoas e incentivos ao consumo "social" de bebida, ela consegue parar de beber.
Os últimos capítulos relatam o diagnóstico de Caroline, câncer. Daí em diante, estar do lado de alguém que se tem ciência da morte é o que nos conta a autora de uma forma tão profunda, que é muito difícil não se emocionar. Principalmente para quem já conhece a dor do luto. "Sei que nós nunca superamos as maiores perdas; nós as absorvemos, e elas nos fazem criaturas diferentes, geralmente mais gentis. Às vezes, eu acho que a dor é que produzr a solução. O luto e a memória criam as suas próprias narrativas." (pg 170)
Depois de 13 anos de convivência, Gail também perde para morte sua cadela Clementine, sendo também mais uma prova de superação a longo prazo. E com tantas dores a autora se despede, satisfeita por dentro de mesmo deprimida ainda estar viva e o que é melhor, sóbria. Com uma lista de projetos a seguir, pois a "vida o mapa da vida de uma pessoa é desenhado por sorte, circunstância e determinação". (página 171).
Muito lindo! Indico! 
 





Ser mulher ...
A Cidade do Sol é de autoria de Khaled Hosseine. Ele é o mesmo autor de O caçador de Pipas, então nem precisa falar muito, pois seu talento literário já é conhecido mundialmente. A história é de duas mulheres, Marian e Laila, que diga-se de passagem, parecem que nasceram para sofrer (óbvio que isso é uma ideologia, o desrespeito aos direitos das mulheres não podem ser baseados em destino ou vontade divina, coisa que acontece infelizmente não só na literatura). As duas por turbulências históricas acabam se tornando esposas do mesmo marido. Esse romance cita muitos fatos históricos ocorridos no Afeganistão (e que acabam por dar destino à vida dos personagens) e muitos costumes de opressão ao sexo feminino. É um livro que indico!


Uma revolução satirizada
A Revolução dos Bichos é uma obra do escritor George Orwell, pseudônimo de Eric Arthur Blair. Aliás, o nome do programa Big Brother foi inspirado em outra obra literária sua “1984”. A Revolução dos Bichos só foi publicado em 1945, período inclusive que os E.U.A demonstrava seu poderio militar em Hiroshima e Nagasaki. O livro é uma metáfora ao regime implantado por Josef Stálin na Rússia Soviética. Orwell nunca visitou o país e seu objetivo era passar uma imagem de como o regime stalinista realmente era.
Infelizmente após sua morte, a CIA comprou o direito de filmar o livro e houve modificações na cena final no desenho animado produzido na Inglaterra. Na versão modificada os animais tomam a casa da fazenda ocupada pelos porcos, enquanto que na obra literária não há como distinguir os exploradores de animais que o precederam. O medo era capitalismo e socialismo ser considerado a mesma coisa.
A leitura do livro é proibida até hoje na China e na Coréia do Norte e no mundo islâmico também, pelo uso de porcos como personagens.
O escritor se tornou um ícone dos que combateram o stalinismo e todas as outras ideologias totalitárias e sua obra possibilita até os dias de hoje uma comparação com a Rússia de Stálin.
Sobre a Granja do Solar na Inglaterra – não poderia citar a Rússia, afinal os soviéticos eram aliados dos ingleses na luta contra o nazi-fascismo no ano de sua publicação.
O major – Karl Marx
Homens – burguesia e/ou capitalismo
Nem precisar dizer que o Sr. Jones é o Czar Nicolau II e que ambos respondem às manifestações com violência.
Os porcos representam a burocracia soviética que passaram a ter privilégio assim como os membros do partido único soviético.
Napoleão passou a decidir sobre os problemas da granja, assim como Stálin criou um regime de partido único. Os outros partidos haviam sido proibidos. Eis a crítica de Orwell, os partidos únicos, os regimes totalitárias, as ditaduras e não o socialismo, pois era um socialista assumido.